-Passe a tarde comigo, tem
cerveja. A notificação acendeu na tela do celular. Como fazer uma visita para
aquele rapaz lindo e interessante, durante uma pandemia mundial? Arriscado?
Sim. Fui? Sim, também. Apareceu no portão para me receber, usava uma regata que
exaltava seus braços fortes, bermuda de moletom e um diferente par de
chinelos. Os vizinhos espiaram e com certeza indagaram minha presença com algum
comentário dito baixo demais para ouvirmos. Eu notei os olhares, um tanto curiosos, talvez maliciosos, quando entrei. Não me importei, ele também não. Foi o fim do tédio de uma quinta feira sem graça na São Paulo cinza e fria de fim de outono. Uma tarde gostosa de descobertas. Não resisto a você e já nem luto mais contra, depois de flertes virtuais, por meses, finalmente seria meu. Devagar, sem pressa. [...]
O sorriso era de menino, os cabelos lisos apareciam por baixo do boné verde do Palmeiras. Alto? 1,83m. Me respondeu feliz, se orgulhava disso. Um lindo rapaz que tinha seus quase 30 anos e uma vitalidade notória de um calouro universitário. Duvidei, que por onde passasse não arrancasse suspiros. Seu sorriso, já lhe abriu diversas portas, oportunidades, calças, bermudas e o que mais desejou. Eu tinha plena consciência disso. Os pelos do peito eram aparados e milimetricamente simétricos, os músculos faziam um desenho bonito, resultado de alguns bons meses de academia. Ele estava Home Office, seu notebook, em stand by, descansava algum lugar no seu quarto.
Beijou-me com pressa e
urgência, seu abraço forte e seu corpo quente, me fez bem. Percorri aquele
corpo com as mãos, passeei pelos ombros, costas, abdômen, coxas e pernas. Logo
estávamos no chão da sala, experimentando um ao outro, senti o gosto dos lábios
carnudos e vermelho-vivo, o odor gostoso das axilas, o sal do suor, o gosto de
alguém que se entrega, sem nenhum medo ou pudor. Encontro gostoso de almas. Dissertou
de uma maneira despojada sobre suas viagens. Portugal, Espanha, dentre outras.
Viagem em casal? Sozinho, adoro viajar sozinho e sem roteiros, gosto de
conhecer pessoas que o acaso me traz, respondeu. Ele gostava do mesmo filme
francês que eu. Aprendi a gostar das músicas da sua play list. Eu gosto
de tequila, me respondeu quando eu disse que gostava de gin e saque. A nossa
conexão era gostosa, ele conversava sempre sorrindo. Perguntei sobre seus olhos
marejados, um tanto avermelhados e curiosamente felizes, eles me arrastavam para
dentro daquele universo, quase como os olhos de Capitu. Me senti Bentinho.
Ganja! Ele respondeu sorrindo. Ao percorrer seu corpo novamente, senti seus
pelos da coxa arrepiados. Rendidos e entregues aos prazeres carnais, nos
entrelaçamos novamente.
Fui embora no início da noite.
A visita vespertina faria parte das minhas lembranças mais gostosas dessa
pandemia. Tinha certeza disso. Foi tão especial quanto lavar a alma no mar,
deixar os pés descalços na areia quente de um dia de verão, deitar de tarde na
rede após o almoço de vó num domingo. Me lembrei de quando o mundo era um lugar
onde as pessoas se abraçavam sem medos, se tocavam sem cuidados. Só amor. Se
tocar com medo é ruim? Certamente. Essa pandemia deixou o mundo mais frio e
triste? São tantos questionamentos. Ainda estamos incertos sobre quando nos
reaproximaremos, realmente entregues. Mas naquele encontro eu me entreguei, meu
peito se encheu de paz, esperança de um mundo melhor, ternura, desejo, tesão e
me distancie dessa realidade maluca, onde noticiam diariamente gestões de
políticas ruins, protestos raciais e curvas ascendentes. Quero a cura do vírus
que tanto estrago já fez? Sim, todos queremos, esperemos a medicina. Mas até lá,
vem ser meu lar, quero morar em você. Me cura desse sentimento triste que
assombra o mundo! Quero a curva do seu sorriso, a curva da sua bunda, o gosto
da sua boca, o som da sua voz rouca... quero ficar bagunçado com você a tarde
toda, concordo com Clarinha Valverde no Spotify, ‘teu beijo é bem melhor
que Pamelor’.