O piano não trazia mais suas belas melodias, os sonhos do guri estavam picados como papéis velhos e sem importância, os olhos estavam úmidos, turvos e distantes, de tantas ilusões e decepções. Tudo se tornou cinza e gelado.
Entrei pela porta da frente, sem fazer barulho, para observá-lo. Ele não me viu, mas podia sentir-me. Aquele frio me desagradava, aquela dor me corrompia. Olhei seus gestos, seu choro, sua voz no meio da noite. Desculpe por não poder fazer nada agora. O silêncio já havia roubado seu sono.
Os pensamentos dele agora eram nublados, opacos, sem brilho e sem vida. Ele não queria sentir novos ventos ou sons de outros lugares, queria a cabeça sobre o peito, queria o cheiro, a pele, o gosto, o abraço e as mãos. Tinha vontade de petrificar julho e sempre olhá-lo com a mesma forma. Olharia a cada inverno, amaria a cada primavera, incansavelmente. Doía olhar os retratos e descasos da guria, sentiu medo do que seria de agora em diante. Se atreveu a inventar e agora não conseguia esquecer e muito menos fugir do tal do amor.
Eu o fiz acreditar que fazia parte da vida dele, e por isso, era impossível esquecer; todos os meus acordes já estavam em sua mente.
O guri lembrou do dia em que jantaram juntos. Tomates e grão de bico, penne e bife. Lembrou do violino e
quase ouviu
"Nearer my Gog to thee" (clique e escute) tocada na sala (por ela) e sentiu vontade de chorar.
O primeiro vazio chegou acompanhado de Agosto. Guardaria as mágoas entre os livros e as besteiras, mas sozinho não era possível, ele precisava de ajuda para isso. Continuou pedindo... Pediu uma mão e depois pediu a outra:
-Por favor não vá.
Enquanto eu ouvia o pedido, de socorro talvez, deitei-me na sala, para fazer companhia as fotos, e pedaços de coração espalhados pelo chão.
Ele então continuou a pedir... pediu perdão, pediu um recomeço:
-Estou aqui. Me perdoa, podemos colocar nossos corações para secar lá fora, no sol.
Pediu um sorriso e mais um carinho na nuca:
-Não faz assim, sinto sua falta.
Mas a porta se trancou e ele ficou para fora:
-Não quero mais. Pare de me ligar, não ache que estou a seu dispor, me deixe. Não me esqueceu ainda? Já te esqueci. - Dizia a guria.
Aquelas palavras também me deixaram atormentado. Se ela estivesse de coração aberto, eu teria me afundado no teu peito.
O guri pediu para Deus que o dia voltasse ao início novamente, assim ele arrumaria o seu quarto, beijaria sua mãe novamente, assistiria um filme francês, tomaria um bom vinho, mas NÃO cometeria o mesmo erro.
O tempo é traiçoeiro demais para voltar atrás e deixar que alguns erros sejam apagados. Eu vou e volto. O tempo não. Prazer em conhecê-los: Amor.
Autores dos rabiscos: eu e
Nadine (obrigado por me ajudar a ultrapassar mais esse obstáculo, obrigado por estar presente nesse momento cinza e turvo, obrigado por comprar minha idéia e fazer parte dos meus dias, sou seu fã).
Antes disso: Despedida [Prólogo] (I), Jaz [Introdução] (II)
Depois disso: Segundo vazio (IV)