sábado, 24 de setembro de 2011

Doces deletérios

O meu amor tinha gosto de amora, o seu de saudade.

No chão do quarto, alguns papéis (pesquisas sobre um país qualquer para o trabalho de Marketing Internacional), seu Lacoste com seu par de meias brancas dentro, uma mochila azul com alguns sonhos, lápis e canetas, um caderno com pouco conteúdo e bastante folhas em branco -assim como setembro- e Placebo com Special K ecoando.
Começou o dia assistindo TV, Reflexos da amizade, durou somente 20 minutos. O tédio e falta de um final surpreendente (pois já sabia como terminaria) o fez voltar para o quarto. Pensou em ver Os sonhadores e o talento do francês Louis Garrel, só pensou.
Sábado é dia de diversão, de sair com os amigos, dia de beber vodka (boa) com suco de laranja e dançar a noite inteira. Sábado é dia de encontrar um amor descartável na próxima música dos Beatles -Come together-, um flerte pelo caminho até o banheiro ao som de Smiths -There is a light that never goes out- ou um encontro de dois corpos (condicionados a beijos sem sentimentos) na fila do bar ao som mais pesado de Nirvana -Pennyroyal tea. Quem estabeleceu tais verdades?
Seu sábado seria na cama SIM, e por motivos tão óbvios, queria mesmo era dizer como Radiohead  em uma de sua canções: 2 e 2 = 5.

No rádio do carro tocava uma canção de uma banda qualquer. Não importava. Olhou para o lado direito e viu o seu próximo amor. Sim, daria seus sonhos, compraria presentes, e conversaria com os seus familiares na sua sala de estar. Abaixou o vidro para ver melhor.
Perdeu de vista... era necessário, o fluxo do trânsito tinha de continuar. Olhou pelo retrovisor, viu distanciar-se de ti, a mais bela pintura daquela terça ou quarta feira. Sorriu e decidiu voltar.
Fez o retorno, dobrou a próxima rua à direita, voltou por três quarteirões até novamente chegar a avenida principal, em um ponto onde sabia que cruzaria novamente com o seu próximo amor. Preferiu o "não" ao eterno "o que teria acontecido se...". Decidiu abordar. Perguntou informações só para ouvir a voz. Enquanto explicava, ele apenas observava. Tinha os olhos negros e brilhantes, o cabelo castanho escuro e uma pele morena avermelhada. Usava uniforme de voleibol e aparentava assistir Glee de tão jovem que era.
Interrompeu as informações, que de fato não usaria para nada e perguntou:
-Tem compromisso? Quer tomar um suco?
A resposta veio com um sorriso, seguido de um sim.

O amor tem tantos gostos... começa com o gosto da novidade, gosto da descoberta...
-Conheci a poucos meses, uma fruta chamada lichia e hoje conheci você.
É nessa época que queremos tocar, sentir, abraçar, estar perto. Ao desenrolar dos dias passa a ter o gosto de amora, aquele que conhecemos, gostamos, mas não é mais novidade. Dependendo do amor passa a ter o gosto da saudade.
Entrou no carro, entrou na minha terça ou quarta-feira, entrou na minha vida e eu não tinha pressa alguma de voltar para casa.

Lembranças de uma terça ou quarta-feira:

  • Estuda Educação Física;
  • Joga Voleibol;
  • 19 anos; 
  • Sobre ter 19 anos: Corpo perfeito, hormônios a flor da pele e libido incomparável;
  • Mora à uma distância de menos de 5 km da minha casa;
  • Tem um sorriso lindo, cheio de sonhos pré fabricados na adolescência;
  •  Tem gosto de amora.

Ligou só na semana seguinte. Acho pouco provável que alguém com 19 anos, queira algo sério com quem quer que fosse, até mesmo com o Ashton Kutcher.  Não, talvez quisesse com essa segunda opção.
Ligou algumas vezes. Quase duzentas, consegui ouvir a voz apenas uma vez. Todas as outras fora de área ou desligado. Continuou a tentar (só para constar). Não sabia qual direção seguir. Se ancorou nas lembranças.


Escreveu em um canto qualquer da pesquisa de Marketing Internacional:
Quero um dia, cultivar menos as recordações. Quero um dia me instalar com mais integridade no possível. Ter de disfarçar a dor, dói mais ainda.


11 comentários:

O banquete de Edson disse...

Frutas e amores. Novos sabores. A vida tem que ser experimentada vlw

Luna Sanchez disse...

Texto gostoso, escorrega pra dentro da gente!

Considerações minhas : nunca assisti Glee, hoje é domingo, não conheço lichia, tem um copo de mate com limão e gelo aqui ao meu lado e Duffy canta em duo comigo (vê bem, é ela quem me acompanha e não o contrário...rs) "Syrup and Honey".

Conhece, Eder?

http://letras.terra.com.br/duffy/1210695/traducao.html

Beijo grande.

Daniele Oliveira disse...

A narração perfeita de uma das paixões da minha vida:aventurar-se,escrever em sua biogrfia histórias que darão sabor a todos os seus dias se quizer,criar arquivos que poderão ser vasculhados sempre que preciso e que servirão de remédio para sanar dores e tédios futuros.Tesouro seu,só seu que ninguém pode tirar...O doce sabor da lembrança,independente do quanto durar depois,do que virá,o momento foi aproveitado,vivido,sugado de todas as formas possíveis e é tão valido que serve de combustível até pra quem lê de fora da situação,consigo sentir na minha boca até os sabores desse momento.
Mais uma vez obrigada por dividir comigo o sabor da sua vida.

Maxwell Soares disse...

Muito bom o texto. Parabéns pela sensibilidade. Bom de se lê. Um abraço.

Briccio disse...

Edson, concordo com você cara, devemos sim experimentar novos sabores!

Luna, viu que tem um link no texto com um breve resumo de Glee? Xarope Doce e Mel com Luna e Duffy, deve ser uma delícia de ouvir. Faz como aquele post, que pediu para agosto ficar... cria um post com o dueto. Um beijo minha linda.

Dan, te reconheço até de Surrender, minha biografia já faz parte do seu cotidiano né? rs Ai meu Deus... ahahahha preciso deixar claro por aqui que NEM TUDO no Blog é sobre mim. Um beijo minha querida.

Luna Sanchez disse...

Eder, se eu cantar lá no blog espanto todo mundo...rs

Beijos, seu fofo.

RENATO VIDAL S. disse...

Eu amei seu blog, seus sentimentos como misturas com letras bonitas, cada estrofe parece o roteiro de um belo filme, cumprimentos.

Anônimo disse...

Precioso tu blog. los escritos son maravillosos.


besos

Briccio disse...

Luna, cante, me manda o demo que eu digo se deve postar. Tenho certeza que sim.

Renato, gracias por visitar, por las felicitaciones y comentarios ... fue realmente la vida sería un drama de película fina. Abrazos.

Lluvia En Silencio La Noche, Volver más a menudo y el gusto ... Me alegro de que haya disfrutado de los textos. Un beso grande.

Jú Sousa disse...

Amei !

Texto fascinante, sincero e cheio de felicidade, aquela felicidade de dois olhares se cruzando sem saber ou ter idéia do que o futuro irá reservar, mais com a certeza de que aquele momento único deve ser aproveitado.

Briccio disse...

Jú... nunca podemos deixar esses momentos passarem. Feliz foi a decisão de ter feito o retorno. rs Beijos!